Entrevista: a importância dos institutos privados para o desenvolvimento de tecnologias no Brasil
- REDAÇÃO H2RADAR
- 18 de fev.
- 6 min de leitura

O avanço tecnológico é um dos principais motores do desenvolvimento econômico e social de um país. No Brasil, no entanto, o setor de pesquisa e inovação ainda é majoritariamente sustentado por instituições públicas, enquanto os institutos privados enfrentam desafios estruturais e financeiros para consolidar seu papel. A experiência do Instituto Avançado de Tecnologia e Inovação (IATI) ilustra a relevância dessas instituições no cenário nacional, ao mesmo tempo em que expõe as dificuldades e oportunidades para sua expansão.
Os desafios da inovação privada no Brasil
A ausência de um ecossistema robusto de institutos privados de tecnologia no Brasil decorre, sobretudo, da falta de financiamento contínuo. De acordo com Paulo Gama, especialista da área, a pesquisa no país é amplamente conduzida dentro de universidades públicas, com suporte governamental, enquanto indústrias multinacionais costumam desenvolver tecnologia fora do Brasil.
Além da escassez de recursos, as instituições privadas enfrentam uma alta dependência de incentivos fiscais e políticas governamentais, o que as torna vulneráveis a mudanças regulatórias. Leis como a Lei do Bem, que concede incentivos fiscais para empresas que investem em pesquisa e desenvolvimento, possuem restrições que limitam sua abrangência. Gama sugere que a ampliação desses incentivos para empresas de Lucro Presumido e Simples Nacional poderia estimular novos investimentos em inovação.
O papel estratégico dos institutos privados e suas fontes de financiamento
Apesar dos desafios, o IATI se destaca como um exemplo bem sucedido de instituto privado comprometido com a inovação tecnológica. Sua atuação abrange setores estratégicos, como energias renováveis, biotecnologia, smart cities, mobilidade elétrica e armazenamento de energia, consolidando-se como um centro de referência em hidrogênio de baixo carbono no Brasil.
Para viabilizar suas pesquisas, o instituto utiliza diversas fontes de financiamento, incluindo o Programa de PDI da ANEEL, parcerias com empresas privadas e apoio de agências de fomento como a FINEP e o BNDES. Além disso, busca expandir sua atuação por meio de cooperações internacionais, atraindo novos investimentos para o país.
O fortalecimento dos institutos privados de pesquisa depende de políticas públicas mais eficientes, incentivos fiscais ampliados e maior participação do setor empresarial no financiamento da inovação. Com um ambiente regulatório mais favorável e investimentos estratégicos, o Brasil pode consolidar seu potencial tecnológico e reduzir sua dependência de inovações importadas.

Confira, a seguir, a entrevista completa do RADARH2 com Paulo Gama, diretor de negócios do IATI:
RadarH2: Em sua visão, a que se deve não termos muitos institutos privados de desenvolvimento de tecnologia no Brasil?
Paulo Gama: Um dos maiores desafios de uma instituição de pesquisa privada no Brasil está relacionado com a perenidade da manutenção dos recursos para pesquisa, desenvolvimento e inovação. No Brasil, a pesquisa e o desenvolvimento em sua grande maioria são feitos na academia pública, financiada pelo governo. As pesquisas privadas acontecem dentro das indústrias e estas, quando são multinacionais, na maioria das vezes, pesquisam e desenvolvem tecnologia fora do país, não investindo no Brasil.
O fato de não termos muitos institutos privados está centrado na falta de recursos contínuos e perenes, que possam viabilizar pesquisa, desenvolvimento e inovação. Inovar é caro e manter uma estrutura física e de profissionais altamente qualificados para pesquisa, desenvolvimento e inovação não custa pouco. Os institutos privados buscam quase sempre recursos de obrigações legais, leis que incentivam ou obrigam as empresas a investirem em P&D&I e com isso conseguem se manter, com bastante oscilação, dentro do mercado. São poucas as instituições que desenvolvem um negócio que, a depender de uma canetada, pode mudar o rumo do mesmo.
RadarH2: Quais as principais motivações do IATI, ou seja, o que é que mantém vocês tão acesos o tempo todo?
Paulo Gama: O IATI possui um propósito nobre que está relacionado com a preservação da vida, entendido aqui de forma ampla. Essa missão motiva os pesquisadores que desenvolvem projetos voltados à descarbonização, melhoria da qualidade de vida dos seres vivos, do meio ambiente com foco em inovação que possa ser aplicada e não somente pesquisada ou desenvolvida. O desafio por encontrar o novo, criar inovação e ver os resultados sendo utilizados faz com que possamos ficar atentos e motivados na maior parte do tempo.
RadarH2: O que você considera como entraves à pesquisa e desenvolvimento tecnológico pelo setor privado brasileiro e o que você proporia em termos de mudança no ambiente institucional para aumentar os investimentos em PDI no país?
Paulo Gama: Como entraves podemos indicar a legislação da Lei do Bem, que apesar de existir, é complexa e restrita apenas a empresa com Lucro Real. Poderíamos ampliar a aplicação para as demais empresas do Lucro Presumido ou Simples Nacional, afinal geram riqueza e valor para o país. Outra abordagem seria evitar com que determinadas leis desviassem recursos da Pesquisa para aplicações com finalidades diferentes, como é o caso da Lei 9.991/2000 que a cada governo é retalhada, de tal forma que os recursos, que já são escassos, acabam sendo direcionados a interesses diversos da finalidade para a qual foi criada.
Um bom exemplo seria usar o mecanismo da ANP para pesquisa, que além de credenciar instituições de pesquisa, tem um regramento baseado nos contratos de concessão, autorizações ou outras obrigações, evitando com que o legislador desvie a finalidade da pesquisa pelo órgão privado, contribuindo assim com a pesquisa, desenvolvimento e inovação no país. Além disso, criar novas obrigações legais para investimento em PD&I para empresas de setores essenciais, como saúde, saneamento básico, construção civil, permitirá aumentar a oferta de recursos para PD&I.

RadarH2: Quais os setores de atuação do IATI?
Paulo Gama: O Instituto Avançado de Tecnologia e Inovação (IATI) atua como referência nacional na execução e gestão de projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI). Seus principais setores de atuação incluem:
Energias Renováveis – Projetos voltados para energia solar, eólica, biomassa e, principalmente, Hidrogênio de Baixo Carbono, sendo o IATI um dos principais centros de pesquisa brasileiros na área.
Biotecnologia – Desenvolvimento de produtos sustentáveis, como biocelulose e biodetergentes, além de pesquisas aplicadas a novos materiais ecológicos e processos industriais.
Smart Cities – Soluções tecnológicas para infraestrutura urbana inteligente, incluindo mobilidade, eficiência energética e monitoramento ambiental.
Mobilidade Elétrica – Projetos de incentivo ao uso de veículos elétricos, como o Trilha Verde, em parceria com a Neoenergia e o Governo de Pernambuco.
Armazenamento de Energia – Desenvolvimento de tecnologias para baterias e novas soluções de armazenamento energético, ampliando a confiabilidade e eficiência das redes elétricas.
Além dessas áreas, o IATI se destaca pela execução de projetos inovadores como o uso de drones para inspeção de linhas de transmissão de energia, desenvolvimento de torres para tratamento de efluentes industriais, e pesquisas avançadas no setor de óleo e gás.
RadarH2: Quais as principais fontes de recursos que o IATI tem utilizado para desenvolver seu trabalho?
Paulo Gama: O IATI tem utilizado diversas fontes de recursos para desenvolver seus projetos, com destaque para:
Programa de PDI da ANEEL – A principal fonte de financiamento para projetos voltados ao setor elétrico, regulamentado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). O IATI participa ativamente desse programa, conduzindo projetos inovadores em energias renováveis, mobilidade elétrica, armazenamento de energia e hidrogênio de baixo carbono.
Parcerias com Empresas Privadas – O Instituto colabora com companhias do setor energético, de petróleo e gás, biotecnologia e tecnologia da informação para desenvolver soluções inovadoras e sustentáveis, promovendo transferência de conhecimento e inovação aberta.
Apoio de Agências de Fomento – O IATI busca recursos por meio de instituições como a FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos) e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), além de outros programas de incentivo à inovação tecnológica.
Convênios e Editais Públicos – A instituição participa de chamadas públicas e editais de fomento à pesquisa e inovação, em parceria com órgãos do governo federal e estadual, fortalecendo sua atuação no desenvolvimento científico e tecnológico.
Projetos Internacionais e Cooperação Técnica – O IATI também busca cooperação com entidades estrangeiras e programas internacionais voltados para inovação e sustentabilidade, como forma de ampliar o impacto de seus projetos e trazer novos investimentos para o Brasil.
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Paulo Gama é Doutor em Engenharia Elétrica pela Universidade de São Paulo – USP, foi consultor em pesquisa e desenvolvimento e inovação para mais de 40 empresas do setor elétrico dentre Geradoras Transmissoras e Distribuidoras de Energia. É Diretor de Negócios no Instituto Avançado de Tecnologia e Inovação - IATI com desafios relacionados com a ampliação e aplicação dos resultados de PD&I no mercado.